Me lembro da minha infância e adolescência em minha cidade natal, uma pequena cidade do interior paulista, Santa Rita do Passa Quatro, onde era muito comum ver as mulheres, minha mãe, tias, mãe de amigos, etc., rezando o terço. Nas salas, cozinhas, quartos, fossem quais os cômodos das casas, eu ficava impressionado com a concentração por parte delas e a exigência de respeito em não incomodá-las. Muitas vezes olhavam para um canto do cômodo, quase sem piscar, e como em um transe ficavam horas recitando as ave-marias e pais-nossos.
Fico pensando hoje que áreas cerebrais alcançavam todos esses esforços. Era muita energia mental empregada nessas orações.
Naquela época não havia tanto stress como hoje mas, a vida é a vida, e responsabilidades e obrigações faziam parte de todos como agora.
E dou aqui um depoimento de como rezar o terço fazia bem àquelas mulheres, mas, algo é evidente: mexia com os cérebros. Naqueles dias não havia a tomografia por emissão de fóton único (SPECT), a tomografia por emissão de pósitrons (PET), a ressonância magnética funcional (fMRI) e a ressonância magnética espectroscópica (MRS); e talvez nem estudos preliminares em neurociência com instrumentos menos complexos...
Mas por que escrever um artigo em que não tenho dados concretos, experiências, para a avaliação do leitor? Faço então uma comparação, uma analogia deste texto com o meu outro artigo “Religião ou Neurorreligação?” -
O esforço cerebral, a fé, as convicções das freiras católicas e dos monges budistas, rezando e meditando, respectivamente, não estão acima das mulheres que rezavam o terço - como as descrevi - em nada no que diz respeito às cargas emocionais envolvidas em todos os processos de cada um. Não é porque uma mulher se tornou freira ou alguém se tornou budista que os seus cérebros são privilegiados em relação às outras pessoas. Pode haver a vocação para tanto mas quantas daquelas mulheres da minha infância não tinham o mesmo potencial para se tornarem freiras? E essa vocação se refere também ao estilo de vida que as freiras e monges adotam ou aceitam, algo talvez não presente nos ideais de vida das mulheres com o terço na mão em minha infância.
Mas elas também iam às missas, participavam constantemente de novenas, ou seja, possuíam uma vida religiosa intensa.
E hoje vejo os evangélicos também com uma vida rica em valores religiosos, práticas constantes de leituras e interpretações da Bíblia, etc. Não que não havia antes mas penso também como essas práticas mexem com os cérebros dos membros das igrejas evangélicas.
Juntando tudo isto dá para se imaginar, no mundo inteiro, com pessoas praticando suas religiões como nesses dois exemplos, que modificações estruturais cerebrais e funcionais podem contribuir para uma melhor qualidade de vida.
Não se engane que em outros países, culturas, etc., as práticas religiosas não sejam intensas, que não são como as do nosso país.
Os hindus também se dedicam diariamente às suas crenças e, por não ser obrigatório a presença em templos, o fazem em suas casas mesmo na maioria das vezes. Cantar hinos devocionais, mantras, meditação, são algumas dessas práticas realizadas com muita fé.
Eu poderia dar exemplos e mais exemplos de outras religiões e seus rituais mas estes três exemplos bastam aqui. Dois pertencentes à religião cristã, católica e evangélica, e outro à mais antiga de todas, o hinduísmo.
De tudo isso você pode concluir que, sentimentos e emoções oriundos das práticas religiosas, a própria fé e a convicção nas crenças, a frequência e intensidade desses ritos, etc., poderão levar a um bem-estar às pessoas, a médio, longo e até curto prazo, que eu chamo de neurorreligações.
Houve, fisicamente e quimicamente, alterações no funcionamento e/ou modificações em pequenas estruturas cerebrais resultando em uma melhoria na vida emocional daquelas pessoas.
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