Palavras-chave: neurociência, neuroplasticidade, Debbie Hampton, Michael Merzenich, cérebro, neurônio.
Introdução.
Este
artigo foi traduzido por mim por dois motivos. Primeiro porque é uma
ótima introdução ao assunto da neuroplasticidade, com as principais
ideias do neurocientista estadunidense Dr. Michael Merzenich,
simplesmente um dos primeiros a entender este tão comentado e estudado assunto
hoje em dia. Segundo porque foi escrito por Debbie Hampton, também
estadunidense, que, após uma tentativa fracassada de suicídio após décadas de depressão, na qual a levou a uma lesão cerebral, estudou sobre
o assunto, se esforçou a se recuperar e venceu. Já escreveu um livro,
possui um blog (citado antes das referências) citando vários problemas
emocionais e dificuldades com problemas neurológicos, ou seja, uma
heroína anônima, uma mulher com uma história de incrível superação! Como
ela diz no próprio blog: “ ...não apenas sobrevivi, mas também me
desenvolvi descobrindo o superpoder que todos nós temos para construir
um cérebro melhor e uma vida alegre. Se eu posso fazer isso, você também
pode.”
O artigo:
A neuroplasticidade tornou-se um chavão na psicologia e nos círculos científicos, assim como fora deles, prometendo que você possa
“re-fiar” (re-wire) seu cérebro para melhorar tudo, desde saúde e
bem-estar mental até qualidade de vida. Há muitas informações
conflitantes, enganosas e errôneas por aí.
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Então, exatamente como isso funciona?
O que é neuroplasticidade
É
um termo abrangente que se refere à capacidade do seu cérebro de se
reorganizar fisicamente e funcionalmente durante toda a sua vida devido
ao seu ambiente, comportamento, pensamentos
e emoções. O conceito de neuroplasticidade não é novo e as menções a um
cérebro maleável remontam ao século XIX, mas com a capacidade
relativamente recente de "ver" permitida pela ressonância magnética
funcional (fMRI), a ciência confirmou esta incrível capacidade de
transformação do cérebro, sem sombra de dúvida.
O
conceito de um cérebro em mudança substituiu a crença anterior de que o
cérebro adulto era praticamente um órgão fisiologicamente estático ou
hard-wired,
após períodos críticos de desenvolvimento na infância. Embora seja
verdade que seu cérebro é muito mais plástico durante os primeiros anos e
a capacidade diminui com a idade, a plasticidade acontece durante toda a
sua vida.
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Para uma explicação detalhada de como a plasticidade acontece fisicamente em seu cérebro, veja o blog: “Masterpiece Or Mess". (1)
Como a neuroplasticidade aparece em sua vida
A
neuroplasticidade torna seu cérebro extremamente resiliente e é o
processo pelo qual todo aprendizado permanente ocorre em seu cérebro,
como tocar um instrumento musical ou dominar uma língua diferente. A
neuroplasticidade também permite que as pessoas se recuperem de derrame,
lesão e anormalidades de nascimento, superem o autismo, ADD e ADHD [TDAH],
dificuldades de aprendizagem e outros déficits cerebrais, saiam da
depressão e dos vícios e reverter padrões compulsivos obsessivos. (Leia
mais: "You’re Not Stuck With The Brain You’re Born With". (2)).
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A
neuroplasticidade tem implicações e possibilidades de longo alcance
para quase todos os aspectos da vida e cultura humanas, da educação à
medicina. Seus limites ainda não são conhecidos. No entanto, essa mesma
característica, que torna seu cérebro incrivelmente resiliente, também o
torna vulnerável a influências externas e internas, geralmente
inconscientes. Em seu livro “O cérebro que se transforma”, (3) Norman Doidge chama isso de “paradoxo plástico”. (Leia mais: “Your Plastic Brain: The Good, The Bad, and The Ugly”. (4)).
Conheço
o poder da neuroplasticidade em primeira mão, pois desenvolvi e
executei meus próprios exercícios baseados em neuroplasticidade,
baseados em experiência durante anos, para me recuperar de uma lesão
cerebral, resultado de uma tentativa de suicídio. Além disso, através de
extensiva terapia cognitivo-comportamental, meditação e práticas de
mindfulness, que incentivam a mudança neuroplástica, eu superei a
depressão, a ansiedade e reformulei totalmente minha saúde mental e
minha vida.
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Mas foi por causa da mudança neuroplástica que eu me tornei uma pessoa informada em padrões depressivos, ansiosos, obsessivos e super-reativos em primeiro lugar.
Os dez fundamentos da neuroplasticidade
A ciência confirmou que você pode acessar a neuroplasticidade para obter uma mudança positiva (5) em sua própria vida de várias formas, mas não é tão fácil quanto alguns neuro-hype gostariam que você acreditasse. No artigo “Neuroplasticity: can you rewire your brain?”, (6) diz a dra. Sarah McKay, neurocientista:
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“A
plasticidade volta a ser 'ON' na idade adulta quando condições
específicas que permitem ou acionam a plasticidade são satisfeitas. ‘O
que pesquisas recentes mostraram é que, sob as circunstâncias corretas, o
poder da plasticidade cerebral pode ajudar as mentes adultas a crescer.
Embora certas máquinas cerebrais tendam a diminuir com a idade, há
passos que as pessoas podem dar para aproveitar a plasticidade e
revigorar essa maquinaria’, explica o dr. Michael Merzenich.
Essas circunstâncias incluem atenção concentrada, determinação,
trabalho duro e manutenção da saúde geral do cérebro”.
Em
seu livro “Soft-Wired: How the New Science of Brain Plasticity Can
Change Your Life” [sem tradução no Brasil], o Dr. Michael Merzenich,
um dos pioneiros na pesquisa da plasticidade cerebral e co-fundador da
Posit Science Corporation [empresa americana que fornece software e
serviços de condicionamento cerebral], lista dez princípios fundamentais necessários para a remodelação do seu cérebro:
1.
A mudança é principalmente limitada àquelas situações em que o cérebro
está com disposição para isso. Se você estiver alerta, envolvido,
motivado, pronto para a ação, o cérebro libera os neurotransmissores
necessários para permitir a mudança do cérebro. Quando desengajado,
desatento, distraído ou fazendo algo sem pensar que não requer esforço
real, seus interruptores neuroplásticos estão "desligados".
2. Quanto mais você tenta, mais motivado fica, mais alerta você é, e quanto melhor (ou pior) o resultado potencial, mais
o cérebro muda. Se você está intensamente concentrado na tarefa e
realmente tentando dominar algo por um motivo importante, a mudança
experimentada será maior.
3.
O que realmente muda no cérebro são os pontos fortes das conexões de
neurônios que estão envolvidos juntos, momento a momento, no tempo.
Quanto mais algo é praticado, mais conexões são alteradas e feitas para
incluir todos os elementos da experiência (informação sensorial,
movimento, padrões cognitivos). Você pode pensar nisso como um
"controlador mestre" sendo formado para esse comportamento específico, o
que permite que ele seja executado com notável facilidade e
confiabilidade ao longo do tempo.
4.
Mudanças nas conexões impulsionadas pelo aprendizado aumentam a
cooperação célula a célula, o que é crucial para aumentar a
confiabilidade. Merzenich explica isso pedindo-lhe para imaginar o som
de um estádio de futebol cheio de fãs batendo palmas ao acaso contra as
mesmas pessoas batendo palmas em uníssono. Ele explica: "Quanto mais
poderosamente coordenadas são suas equipes de células nervosas, mais
poderosas e confiáveis são suas produções comportamentais".
5.
O cérebro também fortalece suas conexões entre equipes de neurônios que
representam momentos separados de coisas sucessivas que ocorrem com
confiabilidade no tempo de série. Isso permite que seu cérebro preveja o
que acontece a seguir e tenha um “fluxo associativo” contínuo. Sem essa
habilidade, seu fluxo de consciência seria reduzido a “uma série de
poças separadas e estagnadas”, explica Merzenich.
6.
Alterações iniciais são temporárias. Seu cérebro registra primeiro a
mudança e determina se deve ou não tornar a mudança permanente. Só se
torna permanente se o seu cérebro julgar que a experiência é fascinante
ou nova o suficiente ou se o resultado comportamental é importante, bom
ou ruim.
7.
O cérebro é modificado pelo ensaio mental interno da mesma forma e
envolve precisamente os mesmos processos que controlam as mudanças
alcançadas por meio de interações com o mundo externo. De acordo com
Merzenich, “você não precisa se mover nem um centímetro para causar uma
mudança plástica positiva em seu cérebro. Suas representações internas
das coisas lembradas da memória funcionam muito bem para o aprendizado
progressivo baseado na plasticidade cerebral”.
8.
A memória orienta e controla a maior parte do aprendizado. À medida que
você aprende uma nova habilidade, seu cérebro toma nota e lembra das
boas tentativas, enquanto descarta as não tão boas. Então, ele lembra o
último passe bom, faz ajustes incrementais e melhora progressivamente.
9.
Todo movimento de aprendizado fornece um momento de oportunidade para o
cérebro se estabilizar - e reduzir o poder disruptivo de - fundos ou
"ruídos potencialmente interferentes". Cada vez que seu cérebro
fortalece uma conexão para avançar seu domínio de uma habilidade, também
enfraquece outras conexões de neurônios que não foram usadas naquele
exato momento. Essa mudança plástica negativa no cérebro apaga parte da atividade irrelevante ou interferente no cérebro.
10.
A plasticidade cerebral é uma via de mão dupla. É tão fácil gerar
mudanças negativas quanto positivas. Você tem um cérebro "use ou perca".
É quase tão fácil promover mudanças que prejudicam a memória e as
habilidades físicas e mentais quanto melhorar essas coisas. Merzenich
diz que as pessoas mais velhas são mestras absolutas em incentivar a mudança plástica do cérebro na direção errada.
Artigo original:
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Debbie Hampton. Neuroplasticity: The 10 Fundamentals Of Rewiring Your Brain. 2015. Disponível em: < http://reset.me/story/neuroplasticity-the-10-fundamentals-of-rewiring-your-brain/ >. Acesso em: 26/07/2018.
Blog pessoal de Debbie Hampton: “The Best Brain Possible” - < https://www.thebestbrainpossible.com/ >.
Referências:
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1 – Debbie Hampton. Neuroplasticity: Are You Making A Masterpiece or Mess of Your Brain? 2014. Disponível em: <
2 – Debbie Hampton. You’re Not Stuck With The Brain You’re Born With. 2015. Disponível em: < https://www.linkedin.com/pulse/youre-stuck-brain-born-debbie-hampton >. Acesso em: 26/07/2018.
3 - DOIDGE, N. O cérebro que se transforma. 1a. ed. Rio de Janeiro: Editora Record. 2016. 420 p.
4 – Debbie Hampton. Your Plastic Brain: The Good, The Bad, and The Ugly. 2014. Disponível em: < https://www.thebestbrainpossible.com/the-good-the-bad-and-the-ugly-2 >. Acesso em: 26/07/2018.
5 – Debbie Hampton. Using Your Body To Change Your Brain. 2015. Disponível em: < http://reset.me/story/using-your-body-to-change-your-brain/ >. Acesso em: 26/07/2018.